Ela é solteira. Não sozinha. Ela pinta as unhas de vermelho
quando quer. Mas, também, sabe deixar as unhas em cacos quando dá vontade.
Esbanja esquisitices ao falar dos seriados prediletos. E se cala quando o
assunto é sobre o porquê dela não ter namorado.
Ela toma chá quando o
tempo é frio e quente também. E bebe cervejas em canecas, como homens
pré-históricos. Ela ri de palavrões e de piadas de humor negro. Mas, também, se
derrete mais do que picolé em frigideira quando recebe um SMS romântico de
madrugada. Mas por que não namora?
Ela acorda, escova os
dentes de quem já usou aparelho, toma um café preto bem forte, se arruma e vai
trabalhar. Prefere usar preto. Mas desbanca qualquer havaiana bonita quando
inova em alguma vestimenta cheia de flores coloridas. Ela é linda e
desconversa. Fala do tempo, do futebol, da novela, da mãe, da crise do Paraguai
e de literatura. Mas por que tu não namoras?
Quando o assunto é
sexo, ela fala mais do que escuta. Escuta com os ouvidos, com os olhos, com a
boca e com os pelos da coxa. Transa menos do que deseja. E sabe esconder alguma
aspirante a Sônia Braga dentro daquele decote comportado. Ela curte Madonna, Djavan e Ira. E fala que eu tenho péssimo tom de voz. Lê Machado, Vinicius,
Quintana e Fernando Pessoa. Mas diz que, também, gosta das minhas histórias.
É estranha, também.
Assumo. Corta o cabelo de acordo com as fases da lua e gosta de comer macarrão
com maionese e feijão com queijo. Gosta de umas bandas que ninguém conhece e
chora com as histórias do Nicholas Sparks. Liga o ar condicionado porque gosta
de dormir sentindo frio e acaba repousando feito uma esquimó com meias e
edredom. Uma linda esquimó, por sinal. Não sabe usar o celular. Costuma atender
as ligações somente após a quarta tentativa de chamada. Não, ela não ignora.
Ela perde tempo é procurando o celular na bolsa, debaixo da cama ou pia do
banheiro. Mas, vez em quando, ela sabe ignorar também. Não sabe dançar. Recusa
os convites, mas adora ser convidada. Odeia batom e gosta de brincos de grandes.
Mas por que ninguém
conseguiu ultrapassar esse muro de Berlim que você ergueu no teu peito? Ela
desconversa. Ri de canto de boca e me pergunta se eu fumo tentando desviar o
assunto pra longe. Eu insisto. Falo coisas demodês e jogo no ar o fato de que
eu a acho perfeita. Ela empina o nariz, me lança aqueles olhos negros enormes e
ajeita-se sobre a mesa. Muda o tom e me fala: “Porque eu não quero”. E eu rio
sem graça da minha maldita ideia de achar que todo mundo quer ter alguém para
dividir os chocolates.
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